sábado, novembro 08, 2014

Contribuição para a história do Centro Cultural de Almada



O Centro Cultural de Almada foi uma associação cultural que existiu nesta cidade portuguesa entre 1979 e a primeira década do século 21. Dedicava a sua actividade permanente à formação de agentes culturais através de cursos técnicos e artísticos, para os quais contava com a colaboração de alguns dos mais reputados especialistas portugueses nas respectivas matérias.

Mas o Centro era mais conhecido do grande público pelas organizações (em colaboração com a Câmara Municipal de Almada) de eventos como feiras do livro, animação de espaços públicos, cinema ao ar livre, festivais de música, etc.

Contudo, esta instituição tinha sido criada por decisão da Assembleia Popular do Concelho de Almada, em 1978. E a ideia era, então, criar uma estrutura coordenadora do movimento associativo. O projecto acabou por não se concretizar dessa forma. 

Nesta entrevista que a Radiodifusão Portuguesa veio fazer a Almada, em 1978, para o programa Contraponto, três elementos do grupo de trabalho da Assembleia Popular para a criação do futuro Centro Cultural faziam o ponto da situação e apontavam objectivos para o futuro.

Entrevistados:

Maria Emília de Sousa (na altura representante do secretariado da Assembleia Popular do Concelho de Almada; mais tarde autarca e presidente da Câmara Municipal de Almada desde 1986

Dina Bastos, então vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Almada

Luís Marques, que viria a ser o coordenador-geral do Centro Cultural de Almada

terça-feira, setembro 02, 2014

Pedido de esclarecimento à ECALMA

Pedido de esclarecimento à ECALMA sobre outros doze (!) pedidos de esclarecimento, nunca respondidos por essa empresa municipal de Almada até à data.

Isto é uma longa história de mentiras e incompetência, à qual já me tenho referido aqui várias vezes. E a que talvez valha a pena voltar mais adiante, de forma mais explícita e desenvolvida.

Da mesma forma, e pelas mesmas razões, talvez valha a pena, também, começar a questionar a sério todos os mitos sobre a "boa gestão" desta câmara...

Um dia destes. Por enquanto, fico à epera de resposta (ou, mais provavelmente, da falta dela). Sentadinho, para não me cansar muito.

terça-feira, julho 22, 2014

O Vôo 007: uma história de "bons" e "maus"

Imagem: fotografia e gráfico copiados do livro 'L'Année de la Photo - Le grand show de l'actualité', edição Love Me Tender - Sipa Press, Novembro de 1983

Em Setembro de 1983, o mundo foi surpreendido e chocado com a tragédia do vôo KAL007 (rapidamente abreviado na comunicação social para "vôo 007"). Um avião, da Korean Airlines, saiu do aeroporto norte-americano de Anchorage, no Alasca, em direcção a Seoul, Coreia do Sul. A meio da viagem, foi abatido por um caça da força aérea da União Soviética. Morreram todas as 269 pessoas que iam a bordo.

Essa foi a notícia que nos foi dada e que deixou todos em choque. Uns incrédulos - "não pode ser! os nossos camaradas da pátria do socialismo nunca fariam tal coisa!" - enquanto não foram vencidos pelas evidências.

Outros, é claro, aproveitaram logo para, sem perder tempo e sem esperar por mais informação, passar ao ataque: "estão a ver como são esses malvados desses comunas!?".

Outros ainda, reconhecendo o evidente, sentiam-se amargurados, desapontados e até traídos. Houve quem me dissesse que, apesar de ser comunista, depois daquilo não poderia continuar a apoiar a União Soviética e os países socialistas.

Claro que havia, também, uns poucos que preferiram não reagir a quente, e ficar à espera de mais informação para tentar entender o que realmente acontecera. Os que conseguiam ter tal tipo de atitude eram poucos, já nesse tempo (e parece que hoje são ainda menos, mas adiante...).

À medida que mais informação foi revelada, ficámos a perceber que, como sempre, a história não era assim tão simples.

Por alguma razão, até hoje nunca esclarecida, o vôo foi desviado da sua rota normal. Estava a passar por cima de bases militares soviéticas (e note-se que aquela era uma zona - a única - em que as duas superpotências militares da época faziam fronteira; logo, era uma zona altamente militarizada). Primeiro, sobrevoou a península de Kamchatka, utilizada pelos soviéticos para testar armamento. Depois, entrou no espaço aéreo da ilha de Sakhalin, onde existiam aeroportos militares e uma base naval da URSS.

Quando foi abatido, já estava, supostamente, na parte final desse percurso. E, supostamente (foi o que disseram os soviéticos, na altura), depois de ser avisado várias vezes... O que, no fim de contas, nos tranquilizava um pouco. Afinal, apesar de todas as vítimas e de toda a tragédia, a URSS teria uma boa desculpa. Era um avião civil usado para espiar as bases militares soviéticas. Foi avisado. Os soviéticos tinham o direito de se defender. A culpa, portanto, era mais de quem o enviou para essa missão suicida do que de quem o abateu em legítima defesa..

Entretanto, o piloto que abateu o avião civil, foi entrevistado pela televisão da URSS. Excertos dessa entrevista passaram nas televisões do "ocidente". O que ajudou a tranquilizar os que queriam continuar a acreditar na "bondade" dos soviéticos, mas também deu argumentos aos que defendiam que, pelo contrário, os soviéticos eram os "maus" da história.

Dizia o piloto que tinha sido enviado numa "missão de combate" (e que bem me lembro destas palavras!...) para defender o seu território, como competia a um militar, e que se limitara a obedecer a ordens. E mostrava-se convencido de que tinha defendido a sua pátria e o seu povo e evitado um mal maior.

Não sei se alguém alguma vez terá feito uma análise científica do vídeo dessa entrevista na perspectiva da psicologia. Gostaria de ver tal análise. Porque acredito que o homem estivesse convencido da justeza (e é de propósito que não uso a palavra "justiça") daquilo que afirmava. Quem abateu um avião civil e matou 269 pessoas que tinham o azar de estar no local errado à hora errada não tinha de ser, necessariamente, um facínora psicopata. Podia ser uma pessoa como outra qualquer, ainda por cima, agindo com a melhor das intenções. Quem estuda essas coisas diz que a percentagem de "verdadeiros" psicopatas (os que têm todas as características associadas a essa patologia) são cerca de 1% da população. Na União Soviética o serviço militar era obrigatório. Logicamente (estatisticamente) a possibilidade de aquele piloto ser um psicopata era, portanto, muito reduzida. Podia ser. Ou não. Mas isso não interessa.

Talvez não seja na sua argumentação (na convicção com que dizia que foi numa "missão de combate" derrubar um avião civil) e na de outros como ele que devemos procurar "o mal".

Passados uns anos, já no tempo pós-URSS, na presidência de Ieltsin, apareceu uma nova versão para explicar o que teria acontecido. De acordo com a nova versão, os soviéticos, afinal, terão confundido o avião civil com um avião espião norte-americano que, no dia anterior, andara pelo mesmo espaço aéreo. E, como não queriam ser apanhados desprevenidos uma segunda vez, terão disparado logo, sem aviso prévio nem nada  - apesar de o avião, quando foi abatido, já andar por ali há bastante tempo, e já ter sobrevoado a tal península militarizada ali perto, e estar já quase a sair do espaço aéreo soviético... (Duvido que os soviéticos confundissem um avião civil com um militar, e duvido que, se queriam mesmo abatê-lo sem aviso prévio, tivessem demorado tanto tempo, e deixado que ele sobrevoasse tanto território militar soviético, mas pronto... é a versão que parece hoje mais aceite).

Perante isto, o que parece serem factos não refutados: o avião foi desviado da sua rota comercial e estava sobrevoar bases militares soviéticas; havia aviões espiões dos EUA que faziam o mesmo; a União Soviética tinha consciência da vulnerabilidade daquele território - que faz fronteira com os EUA (com o Alasca) e, naturalmente, encarava essas incursões como uma ameaça (os EUA teriam o mesmo tipo de desconfiança com qualquer aeronave que, vinda da URSS, invadisse o seu espaço aéreo, ainda por cima sobrevoando bases militares).

Isso justifica o abate do avião e a morte daquelas 269 pessoas? Penso que não. Mas havia alternativas? Não sei. A culpa é de quem? De quem disparou sobre o avião ou de quem o meteu naquele espaço aéreo? Também não sei.

Tenho muita dificuldade em lidar com categorias filosóficas ou religiosas como "bem" e "mal". E, mais ainda, com a ideia de "bons" e "maus".

Quando separamos as pessoas em "bons" e "maus" e olhamos para o que fazem como manifestações do "bem" ou do "mal", acabamos a medir os narizes uns dos outros. Os de nariz grande são os "maus". Ou o contrário. Depende da nossa noção do que é o "bem" e do que é o "mal".

(Em tempos que já lá vão, a definição de "bem" e "mal" era prerrogativa das religiões; desde a revolução insustrial, e cada vez mais, tal prerrogativa tem sido transferida para os meios de comunicação e a cultura pop, que nos "ensinam" como devemos pensar... Mas isso, como se costuma dizer, são outros quinhentos.)

Prefiro falar de agressores e vítimas, porque é mais objectivo. E, nesse caso, penso que as vitimas têm o direito de se defender dos seus agressores. Mas, quando passam de vítimas a agressores, continuam a ter o direito?

Parece que há quem pense que sim. Porque, se os agressores são "maus", as vítimas, para se defenderem, têm o direito de lhes fazer mal. E as vítimas passam a agressores e os agressores passam a vítimas. Os "bons" têm todo o direito de ser cruéis quando se trata de castigar os "maus". E assim infinitamente, in saecula saeculorum...

(Não sei se vale a pena acrescentar que não contribuo para esse peditório.)